Só 5% dos fumadores consegue deixar de fumar sem ajuda: O que está por detrás do medo?

A maioria dos fumadores quer deixar de fumar. Só 5% o consegue sem ajuda médica. No Dia Nacional do Não Fumador, o site Impala.pt falou com um psicólogo para perceber os maiores desafios subjacentes à libertação do vício.

Só 5% dos fumadores consegue deixar de fumar sem ajuda: O que está por detrás do medo?

 

O tabaco, em Portugal, contribui para uma morte a cada 50 minutos. Cerca de 80% dos fumadores expressam vontade de deixar de fumar. Apenas 5% o consegue com êxito e sem ajuda médica. Todos os anos, 35% dos fumadores tentam deixar de fumar, contudo, a taxa de sucesso é reduzida.

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Estes são os dados dos mais recentes estudos realizados em Portugal. O tabaco é uma das principais causas evitáveis de morte prematura por cancro, por doenças respiratórias e doenças cérebro-cardiovasculares. No entanto, dia 17 de novembro celebra-se o Dia Nacional do Não Fumador. «Este é um dia focado na saúde», afirma Dr. Paulo Vitória, psicólogo e professor no Departamento de Ciências Médicas da Universidade da Beira Interior.

Só 5% dos fumadores consegue deixar de fumar sem ajuda: O que está por detrás do medo?
Só 5% dos fumadores consegue deixar de fumar sem ajuda: O que está por detrás do medo?
Nova campanha do Dia Nacional do Não Fumador

Portugal é o único país no mundo que tem o Dia do Não Fumador. Apesar do número de pessoas que fuma ser elevado, este é um dia que pretende o reverso. «É no fundo uma forma de celebrar as pessoas que têm comportamentos que promovem a saúde, como os não fumadores.»

«Deixar de fumar é libertar-se de um pedaço de si próprio»

Deixar de fumar é difícil e envolve vários processos. Fumar é um comportamento que está associado a um hábito. E os hábitos são sempre difíceis de mudar. Tornam-se dependências e colam-se à identidade das pessoas. «As pessoas quando querem deixar de fumar, estão a libertar-se de um pedaço delas próprias.» O Dr. Paulo Vitória alerta para o conflito que o processo pode causar. É importante fazer-se o luto do pedaço que as pessoas perdem: O «eu fumador» para o «eu que não fuma». Depois podem surgir as saudades: «O tabaco é um vício que está associado a rotinas e a celebrações.»

«Fumar é a pior das dependências»

Fumar é um hábito associado a dependência física e psíquica. «Fumar é a pior das dependências», afirma o Dr. Paulo Vitória, acrescentando que «a maioria das pessoas que fuma está dependente».

«É muito raro encontrar uma pessoa que faça o uso recreativo de tabaco como fazemos do álcool. As pessoas fumam ou não fumam. 95% dos que fumam são dependentes.»

Física, comportamental, situacional e emocional. O ato de fumar envolve várias componentes. É um ato complexo e é influenciado por diversos fatores.

A nicotina, presente nos cigarros, cria uma dependência física. O ato de fumar tem uma forte componente comportamental. «Não há nenhuma droga que seja consumida 10 a 15 vezes por dia como o tabaco.» Está associado a momentos do dia-a-dia. Depois do café, em festas, quando sai do trabalho. São muitos os pretextos para acender um cigarro. Por fim, há a questão emocional. A forte relação emocional que uma pessoa gera com o tabaco. Todas estas componentes vão reforçar a questão da dependência.

Uma sociedade da informação desinformada

Na sociedade de hoje em dia impera a informação. Todos os anos são divulgados inúmeros estudos que alertam para os riscos do tabaco e as doenças que pode provocar. Mas é também nesta sociedade que há um maior número de jovens a iniciar o vício do tabaco. E como? O ser humano tem uma relação subjetiva com a informação. «Uma coisa é existir informação, outra coisa é a forma como a processamos», afirma o psicólogo. Se pensamos na iniciação ao tabaco, pensamos em jovens. «O pico acontece aos 12/15 anos, numa altura de transição – a puberdade/adolescência – que é uma crise.»

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Segundo o psicólogo, «a informação é importante, mas não é suficiente para prevenir a iniciação do consumo do tabaco». Nos últimos anos registou-se uma evolução nos tratamentos. A rede de consultas do Serviço Nacional de Saúde expandiu, os profissionais de saúde estão mais formados e há cada vez mais medicamentos novos para ajudar as pessoas a deixar de fumar.

Não existem fórmulas mágicas para deixar o vício de fumar. Mas há etapas que podem ser fulcrais neste processo. «Se as pessoas querem saber se têm ou não uma dependência, o melhor é experimentar deixar de fumar sozinhos. Caso não consigam, então é uma prova de que precisam de ajuda.»

Nos acompanhamentos a pessoas que querem deixar de fumar é feita uma conjugação de duas estratégias. Por um lado existe o apoio psicofarmacológico, tendo em conta que a nicotina é uma substancia psicoativa que tem de ser tratada como nas outras drogas. Por outro lado, há o apoio emocional, em termos de aconselhamento.

«É importante existir alguém com quem estas pessoas possam falar e pedir conselhos», reforça o psicólogo.

A ansiedade e o medo

A ansiedade e o medo são dois dos fatores mais cruciais e que podem impedir o tratamento. «A ansiedade tem um fundo emocional que temos muita dificuldade em lidar com ele: o medo», explica o Dr. Paulo.

O medo surge porque a nicotina e outras drogas em termos neurofisiológicos tocam em áreas que geram respostas vitais, por exemplo o sono, alimentação, o sexo. Por outras palavras, quando falta a nicotina, o nosso cérebro gera uma resposta e acaba por não perceber se o que falta é a nicotina ou alimento. O que sabe é que falta algo vital.

Quando as pessoas resolvem o conflito – a parte emocional – resolvem o sintoma. A ansiedade é controlada e assim o cérebro não dispara. Por exemplo, as pessoas que deixam de fumar e não entram em conflito normalmente não aumentam de peso.

O aparecimento do tabaco aquecido e a reviravolta que veio causar

«Acho que estas alternativas podem ser positivas numa questão de redução de danos», começa por explicar o especialista. «Mas como tudo na vida tem vantagens e desvantagens», acrescenta.

A redução de danos é uma das principais vantagens. Porém não significa que estes riscos não deixem de existir. Do outro lado da moeda, está o facto de representarem «armadilhas». Por um lado, as pessoas que querem deixar de fumar vêem uma alternativa. Se não existissem estas opções, «o processo de deixar de fumar podia ser mais rápido». Por outro lado, o facto de se propagar a ideia de que têm menos riscos ou a ideia de que não faz tão mal, como o tabaco convencional, pode ser uma iniciativa à iniciação.

«Hoje é o dia D» – A melhor forma de deixar de fumar é começar hoje

O psicólogo Paulo Vitória reforça a importância da ajuda de um profissional de saúde. «É fundamental olhar para isto como uma experiência, como algo positivo.» Não associar este processo a algo negativo, como um esforço, é meio caminho andado para o sucesso. Nas suas consultas de acompanhamento a pessoas que querem deixar de fumar, o psicólogo marca o «dia D», também conhecido como o dia em se vai iniciar o processo de libertação do vício do tabaco.

O ano novo, vida nova, nestes casos, deve ser antecipado. Para muitas pessoas, o dia 1 de janeiro é visto como o início de novas experiências e libertação de coisas menos positivas, como o tabaco. No entanto, o especialista revela que o facto de prolongar o processo «gera ansiedade». Os fumadores começam a contar os dias e muitas vezes o resultado final é desistir. «Temos o 17 de novembro, Dia Nacional do Não Fumador, como um excelente pretexto para começar», conclui Dr. Paulo Vitória.

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Texto: Jéssica dos Santos - Redação WIN - Conteúdos Digitais

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