O que impede as armas nucleares de detonarem acidentalmente?

Existem várias estratégias para evitar que as armas nucleares detonem por acidente. Onde e como os seus componentes nucleares são armazenados é uma delas.

O que impede as armas nucleares de detonarem acidentalmente?

As armas nucleares podem matar milhões de pessoas, destruir cidades inteiras e tornar o solo na zona de precipitação infértil por várias gerações. De acordo com a Associação de Controlo de Armas, os nove estados nucleares do mundo – China, França, Índia, Israel, Coreia do Norte, Paquistão, Rússia, Reino Unido e Estados Unidos da América – têm um arsenal combinado de cerca de 13 mil ogivas nucleares. Uma das questões levantadas por todos este poderosíssimo arsenal levanta questões óbvias. Por exemplo, quais são as chances de uma denotação acidental? E que medidas estão em vigor para garantir que não detonem inadvertidamente?

Enquanto algumas das primeiras armas nucleares eram frágeis, ou voláteis, as modernas são cuidadosamente projetadas com altos níveis de proteção, segurança e confiabilidade, diz Philipp C. Bleek, professor associado de estudos de não proliferação e terrorismo no Middlebury Institute de Estudos Internacionais em Monterey, na Califórnia. Isto significa que a denotação acidental é “extremamente improvável”.

“No seu ambiente normal [armazenado], uma arma nuclear dos EUA não deve representar um risco de explosão acidental de 1 em mil milhões”, assegura Bleek, citado pela Live Science. “Num ambiente anormal, [o risco] é de um num milhão.” Um ambiente anormal, de acordo com Bleek, pode incluir situações como “incêndio no local onde uma arma nuclear está armazenada ou a queda de uma aeronave que transporte armas nucleares”. Ambos os exemplos, observa Bleek, já ocorreram, mas as armas nucleares não detonaram.

“As armas são projetadas para serem ‘seguras num ponto'”, acrescenta Bleek. Portanto, se um único componente explosivo de uma arma for detonado acidentalmente, a probabilidade de uma deflagração nuclear superior a quatro quilotons não deve exceder uma num milhão. A título de comparação, a bomba lançada sobre Hiroshima tinha 15 quilotons.

Para garantir que as bombas nucleares tenham apenas uma chance num milhão de detonar após qualquer tipo de acidente ou incidente, o Departamento de Energia dos EUA determina que estas armas “incluam vários conjuntos de elos fortes, elos fracos e barreiras aninhadas umas nas outras, com cada subsistema de segurança amplamente independente dos outros”.

Esta diretiva garante que os diferentes subsistemas da arma sejam suficientemente independentes. A utilização de dois desses subsistemas de segurança alcançará uma garantia de sistema de um num milhão, enquanto três fornecerão um em mil milhões. A segurança contra detonação acidental, de acordo com o Departamento de Energia dos Estados Unidos, “só é possível se os modos de falha de cada subsistema de segurança forem verdadeiramente independentes uns dos outros”.

Até ao momento, apenas duas bombas atómicas foram lançadas com a única intenção de causar morte e destruição generalizadas: os bombardeamentos dos EUA nas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki – em 6 e 9 de agosto de 1945 –, que mataram cerca de 214 mil pessoas e causaram ferimentos graves e doenças permanentes a centenas de milhares de outras pessoas.

Nos 80 anos seguintes, a nossa compreensão de como as armas nucleares operam melhorou, ao ponto de serem hoje muito mais poderosas e potencialmente destrutivas. A B83, a bomba mais poderosa do acervo nuclear dos Estados Unidos da América, tem rendimento máximo de 1,2 megatons, o que a torna 60 vezes mais potente do que a bomba lançada sobre Nagasaki. O Arquivo de Armas Nucleares sugere que os EUA têm 650 atualmente no ativo.

Os protocolos para evitar armas nucleares de explodirem por acidente

O que impede as armas nucleares de detonarem acidentalmente?
Os bombardeamentos dos EUA em Hiroshima e Nagasaki em 6 e 9 de agosto de 1945 mataram cerca de 214 mil pessoas e provocaram ferimentos graves e doenças a centenas de milhares de outras

Algumas das medidas de segurança mais importantes incluem monitorizar cuidadosamente os componentes e substituir módulos, peças desatualizadas ou redundantes em tempo úitl. “As armas nucleares têm componentes de vida útil limitada, em particular o chamado gás de reforço que fornece combustível de fusão”, explixa Bleek. A fusão ocorre quando dois átomos leves se unem, ou se fundem, para formar outro mais pesado. Porém, quando o material radioativo presente nas armas nucleares decai, deve ser reabastecido a níveis seguros.

Por exemplo, o trítio, isótopo radioativo do hidrogénio, tem uma ‘vida’ estimada de apenas 12,33 anos, diz Bleek. O que significa que metade da quantidade decai dentro deste período. Isto quer dizer que é necessário o máximo de atenção sobre as armas que contenham trítio. Outros componentes também têm vida útil limitada, o que leva à necessidade de serem ocasionalmente praticamente reconstruídas.

“O componente com maior longevidade de uma arma nuclear é o poço de plutónio, que pode ter uma vida útil superior a cem anos”, elucida Bleek. Estes fossos são elementos-chave nas ogivas nucleares. Trata-se de conchas esféricas de plutónio que por norma têm o tamanho de uma bola de futebol. Quando uma arma nuclear é detonada, o plutónio desencadeia uma pequena reação nuclear. Isto, por sua vez, cria uma explosão secundária mais substancial na carga nuclear principal. Simplificando, o poço contém o material que permite que uma arma nuclear se torne verdadeiramente numa bomba.

“As armas nucleares modernas têm os chamados controlos de uso, que impedem qualquer detonação indesejada”, diz Bleek. “Por exemplo, uma ogiva de míssil precisa de passar por certas condições antes de se armar, de modo que não possa – ou, pelo menos, seja extremamente improvável – detonar no silo ou a bordo de um submarino.”

Além disso, as armas nucleares modernas foram cuidadosamente projetadas para garantir que, quando inativas, os materiais que precisam de combinar-se para criar uma explosão nuclear sejam mantidos separados. São usados até seis dispositivos de segurança numa arma nuclear para garantir que não ocorra uma detonação inadvertida. Alguns destes dispositivos de segurança, como chaves inerciais (que disparam em caso de choque ou vibração) ou acelerómetros (que medem a vibração ou aceleração do movimento de uma estrutura) permitirão que o armamento ocorra somente se forem submetidos a uma ação muito específica, grau de aceleração ou vibração durante um período de tempo específico.

O próprio material nuclear também tem salvaguardas. “As armas nucleares contêm uma certa quantidade de urânio ou plutónio altamente enriquecido – se tivermos a quantidade suficiente deste material num volume suficientemente pequeno (a chamada ‘massa crítica’), haverá uma reação nuclear imediata”, explicou Mark Bell, professor associado de ciências políticas da Universidade de Minnesota, também citado pela Live Science.

Para uma arma nuclear detonar, diz Bell, uma ação deliberada deve ser tomada para reunir o material. Normalmente, isto é feito de duas formas. Uma dessas formas – usada nos chamados dispositivos do tipo arma – é “disparar um pedaço de urânio altamente enriquecido sobre outro pedaço de urânio altamente enriquecido” para que, “juntos, formem uma ‘massa crítica’ e desencadeiem uma explosão”. Este é o tipo mais simples de arma nuclear e o tipo de bomba que os EUA usaram em Hiroshima durante a Segunda Guerra Mundial.

“A alternativa, que é mais complicada, mas permite criar uma explosão maior, é usar uma esfera oca de plutónio e esmagá-la numa bola para formar uma massa crítica que então explode”, diz. “Mas, como o material não é uma massa crítica enquanto a arma está inativa, não há muito perigo de ela explodir espontaneamente.” Este tipo de denotação, chamado de dispositivo de implosão, foi o que os EUA usaram em Nagasaki.

Quem toma a decisão de acionar as armas nucleares

Embora seja essencial estabelecer medidas para garantir que uma arma nuclear não detone sozinha, outras considerações exigem maior investimento de tempo e contemplação, “mais para evitar o uso não autorizado, roubo, etc. do que para evitar que detonem do nada”, explica o professor. “Seria difícil para uma pessoa comum detonar uma arma nuclear se ela se deparasse com ela. Nos Estados Unidos da América, por exemplo, existem os dispositivos Permissive Action Links (PAL) embutidos em armas nucleares que tornam muito difícil armá-las ou detoná-las sem a autoridade ou os códigos apropriados.”

No entanto, tanto Bell como Bleek advertem que certas pessoas possuem muito mais energia nuclear do que outras e que a capacidade de disparar armas por capricho, em oposição a qualquer tipo de detonação acidental, é muito mais provável que seja a causa de qualquer desastre futuro.

“O uso nuclear acidental ou não autorizado é muito menos provável, na minha opinião, do que o uso deliberado, mas precipitado”, teme Bell. “Basicamente, não há travagens nem contrapesos para evitar que o presidente dos EUA, por exemplo, ordene o lançamento de armas nucleares. Na verdade, todo o sistema é essencialmente configurado para garantir que eles possam fazê-lo. Isto é o que me mantém acordado à noite muito mais do que as preocupações com acidentes ou armas nucleares a explodirem espontaneamente.”

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