Chega é caso de estudo com “militantes digitais” e narrativa populista

O Chega é um caso de estudo na política e nas redes sociais, com uma narrativa simples e populista, uma estrutura semiprofissional, apoiantes que são “militantes digitais” e que partilham “uma cultura de liderança”.

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A caracterização é feita pelos investigadores Gustavo Cardoso e José Moreno, que coordenam um projeto do MediaLab do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e a Empresa (ISCTE), em parceria com a agência Lusa, para aferir a desinformação e os conteúdos a circular nas redes e sociais e no meio ‘on-line’ no período pré-eleitoral.

À Lusa, os dois investigadores consideram que o Chega “é um caso de estudo”, comparável, com as devidas distâncias ideológicas, ao Podemos, de Espanha, dado que ambos os partidos tiveram um progresso gradual, com a eleição de um deputado, e usaram depois a ideia de que “isto é só o princípio”. Ou seja, a ideia de que “somos pequeninos, mas vamos chegar a ser um dos grandes”, criando “uma narrativa” usada politicamente e nas redes.

É preciso fazer acreditar que é possível ‘chegar lá'”, ser “tão grande como o outro que está no poder”, essa é a narrativa das redes e “tudo aquilo que se passa nas redes tem que ser lido desta maneira, que é possível chegar lá, é possível destronar o PSD”, disse Gustavo Cardoso.

José Moreno sublinhou, por seu lado, que já se deteta “uma certa profissionalização” por parte dos responsáveis do Chega, porque “aprenderam a utilizar as redes”.

E a estratégia, segundo os dois investigadores, é clara e explicada pelo diretor do Obercom, Gustavo Cardoso, fazendo um paralelismo entre a utilização das redes sociais com objetivos comerciais. Para o negócio e para a política, o objetivo é o mesmo, a procura do que “transforma um conteúdo em algo viral”.

Primeiro, explicou, é preciso “ir ao encontro de uma perceção já estabelecida na sociedade”, ou seja falar às pessoas que se “sentem ameaçadas por imigrantes”, em países europeus, ou a corrupção, em Portugal, o que tem “um potencial de viralidade muito grande”.

“E os políticos também sabem disso”, afirmou Gustavo Cardoso, que sublinha que os “‘likes’ não são votos.

O partido de André Ventura é recordista de “likes” (gostos) e interações e, na primeira semana de fevereiro, por exemplo, teve 254 mil “likes” no Facebook, 145 mil seguidores no Twitter/X, quase 315 mil seguidores no Instagram e 207 mil no TikTok.

Sendo um “partido de protesto”, que está contra, “mais do que a favor de algumas coisas”, e por isso é-lhe “mais fácil [mobilizar] porque as pessoas têm sempre alguma razão de queixa”.

A partir daí, “é muito fácil fazer vídeos” sobre temas que podem não ser muito políticos, mas que “capturam a atenção”, como o caso da caça às multas, algo que nem Luís Montenegro, do PSD, Pedro Nuno Santos, do PS, por exemplo, fariam porque são mais institucionais, argumentou.

José Moreno notou que André Ventura conseguiu a publicação mais viral, na primeira semana de fevereiro, com um vídeo no TikTok sobre a caça à multa pelas polícias, que “nunca seria objeto de discussão política”, mas foi visto 687 mil vezes, 30 mil ‘likes’ e mais de mil comentários.

O “discurso populista é tão volúvel” quanto incongruente, dado que, neste caso, o mesmo político que faz a defesa das forças de segurança “é o mesmo que, no Tiktok, levanta o véu” para a possibilidade de os polícias “andarem a fazer uma caça à multa”.

Há ainda outros traços neste caso de estudo do Chega — o grande envolvimento dos “militantes digitais”, mesmo fora de período eleitoral, e que, ao contrário de apoiantes de outros partidos, não têm problemas em partilhar conteúdos do partido.

As pessoas que apoiam o Chega “não têm esse problema porque se identificam com uma causa” e, “acima de tudo, partilham um culto de liderança”, segundo Gustavo Cardoso.

“É impossível compreender aquilo que se passa nas redes por parte de um partido se não percebermos a narrativa e a relação que existe entre os militantes e o partido”, descreveu.

Um estudo pós-eleitoral de março de 2022, depois das legislativas, do ISCTE/ICS, concluiu que a maioria dos inquiridos se informou sobre as eleições maioritariamente nas televisões e apenas 14% disseram tê-lo feito através das redes sociais (Facebook, Instagram e Twitter).

NS/LM // PC

By Impala News / Lusa

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