Apoio ao desenvolvimento pode recuar 20 anos com a pandemia

O presidente do instituto Camões disse hoje que a pandemia de covid-19 pode provocar um retrocesso de 20 anos no apoio ao desenvolvimento e defendeu a urgência de adaptar a cooperação portuguesa a um cenário “complexo e imprevisível”.

Apoio ao desenvolvimento pode recuar 20 anos com a pandemia

“Perante a realidade pandémica, entre 88 milhões e 115 milhões de pessoas serão arrastadas de novo para a pobreza extrema. Estamos perante um possível retrocesso de cerca de 20 anos nos esforços dos parceiros do desenvolvimento”, disse João Ribeiro de Almeida.

O presidente da agência pública de cooperação, que falava hoje numa conferência ‘online’ sobre as novas tendências do apoio ao desenvolvimento, alertou que este cenário torna “praticamente inalcançável” a meta de erradicar a pobreza externa até 2030.

Há estimativas “muito preocupantes” que indicam que, mesmo sem o efeito covid-19 ou com a pandemia a terminar brevemente, cerca de 6,1 por cento da população mundial viverá em pobreza extrema em 2030, citou.

Por isso, defendeu, num contexto em que o apoio ao desenvolvimento está “inevitavelmente” marcado pela covid-19, as respostas e modelos tradicionais de cooperação, já insuficientes antes da pandemia, tornaram-se ainda mais insuficientes para “responder a problemas complexos”.

Para João Ribeiro de Almeida, a pandemia colocou em evidência a “urgência de mudanças e reformas nos sistemas de cooperação para o desenvolvimento”.

Isto, num cenário em que, aos problemas colocados pelas alterações climáticas, pelas ameaças terroristas ou de segurança e pelas necessidades de sustentabilidade energética e de segurança alimentar, se junta a “necessidade de encontrar uma resposta imediata aos problemas resultantes” da pandemia, na área da saúde, mas também da educação.

Para o diplomata, todos estes desafios “exigem respostas conjuntas e modelos robustos que ponham em prática medidas de apoio à resiliência, mas também novas formas de pensar e agir ajustadas à arquitetura internacional de cooperação e ao objetivo de não deixar ninguém para trás”.

Para isso, sublinhou, as agências estatais “olham para o setor privado e para os diversos atores da sociedade civil, que estão no terreno, como parceiros imprescindíveis”.

“Todo este mosaico tem de saber trabalhar em conjunto porque senão a batalha está completamente perdida e a guerra ainda mais. Há que repensar todos os modelos de cooperação para o desenvolvimento”, disse.

Portugal tem em construção a sua nova estratégia de cooperação 2021-2030, que, segundo Ribeiro de Almeida, não poderá “ficar alheia ao novo contexto”.

“Em tempos difíceis, medidas extraordinárias poderão ser equacionadas, justificando uma análise do modelo da nossa cooperação com vista a torná-lo mais operacional e disponível a responder numa lógica inclusiva”, disse.

Mas, apontou, qualquer que seja o modelo, “será sempre preciso dotar o sistema de cooperação portuguesa dos recursos e meios que lhe permitam eficácia, eficiência e muito mais agilidade para atuar numa conjuntura complexa e imprevisível”.

Para o presidente do Camões, a escassez de recursos num país como Portugal deve incentivar a “uma maior concentração geográfica e setorial” da cooperação, bem como promover um envolvimento crescente do setor privado e aprofundar o trabalho com as organizações da sociedade civil.

João Ribeiro de Almeida disse ainda que Portugal tem em preparação durante este ano os programas estratégicos de cooperação com São Tomé e Príncipe, Moçambique e Cabo Verde.

O seminário “Cooperação para o Desenvolvimento: Tendências e Perspetivas” realizou-se no âmbito do Projeto Presidência “Por uma Europa aberta, justa e sustentável no mundo”, da Plataforma Portuguesa das ONGD, e reuniu um conjunto de especialistas para debaterem o futuro das políticas de cooperação para o desenvolvimento e o papel que a UE neste processo.

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