Teatro do Imigrante estreia-se hoje em Lisboa com peça “Na boca do tubarão”
Cinco atores brasileiros e um ator português juntaram-se e fundaram o Teatro do Imigrante, que estreia hoje, em Lisboa, a primeira criação do grupo, “Na boca do tubarão”, disse à agência Lusa o diretor da companhia.
Composta por atores com idades entre os 30 e os 40 e poucos anos, a companhia tem artistas brasileiros provenientes do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pará, Maranhão e um ator português, acrescentou Marcelo Andrade, diretor da companhia, em entrevista à agência Lusa.
“Na boca do tubarão”, que fica em cena na Sociedade Filarmónica Recordação D’Apolo, na Ajuda, em Lisboa, aborda questões xenófobas, a crise migratória, a maneira como “as pessoas são abandonadas à sua sorte”, e é ponto de partida de uma companhia que quer “fazer frente ao avanço da extrema-direita e do discurso de ódio”, porque “o discurso de ódio mata”.
O objetivo do grupo “é que seja aberto”, observou Marcelo Andrade, acrescentando que não é pelo facto de se chamar Teatro do Imigrante “que não vai aceitar artistas portugueses ou de outras nacionalidades”.
A ideia principal era “criar um espaço de acolhimento de artistas imigrantes que não tivessem, por exemplo, a possibilidade de estar numa companhia portuguesa ou que não tivessem outros trabalhos”, frisou.
“O que mais queremos é que os artistas portugueses também estejam com os imigrantes debatendo sobre questões de imigração”, referiu, sublinhando, pretenderem ter “o máximo que conseguirem, todo o tipo de nacionalidades representadas” na companhia.
Só assim poderão “debater políticas de imigração como todo o mundo, como toda a sociedade” e “dialogar com todos os públicos, de todas as nacionalidades, sobre várias perspetivas”.
“Foi para isso que o grupo nasceu” quando, em novembro de 2023, os atores começaram a juntar-se para formar o grupo e andaram de espaço em espaço até irem parar à Sociedade Filarmónica Recordação D’Apolo, que os acolheu muito bem, lhes disponibilizou um espaço para ensaios e onde hoje estreiam a primeira peça, disse.
Ator no Brasil, Marcelo Andrade chegou a Portugal há quase quatro anos para fazer um mestrado e nunca mais representou.
Como nunca esteve tanto tempo sem representar, pensou em juntar atores que “tivessem dificuldade em integrar-se em companhias portuguesas”, surgindo assim a primeira produção em Portugal, com a qual pretendem conseguir vir a viver apenas do teatro.
Apesar de os atores que compõem o grupo serem profissionais, todos têm outros trabalhos que lhes garanta meios de subsistência.
“Na boca do tubarão” é composta por três histórias e a narrativa assenta numa “linha condutora, um tubarão branco”, disse o autor e diretor da peça. Questionado sobre se o tubarão branco representa a extrema-direita, Marcelo Andrade disse que não.
A peça vai mais longe, deteta o preconceito, o que está impregnado, o que é impensado, o discurso de ódio, que tudo destrói.
A primeira história da peça põe em cena um pai e uma filha a debaterem o aumento da extrema-direita em Portugal e na Europa e deixa uma pergunta “em que momento do nosso quotidiano vamos ter um discurso sobre políticas anti-imigração?”
Algumas falas da peça retratam atitudes xenófobas ouvidas pelo autor “em locais onde trabalhou”. Não contra si, mas contra algumas minorias específicas, indicou, exemplificando com o caso de “senhora muito querida e muito fofinha que se referia a uma determinada minoria dizendo que têm filhos que nem baratas”.
Marcelo Andrade sustentou ainda que “o discurso de ódio tem vindo a crescer”. “Paulatinamente, (…) sinto que existe um crescendo, principalmente nas redes sociais”.
Quando chegou a Portugal existia “um discurso aqui e acolá nos comentários e nas caixas de mensagens, que agora está a aumentar muito”.
E se enquanto frequentou mais o meio académico, Marcelo Andrade disse não ter sentido tanto o discurso de ódio, com a convivência com todo o tipo de pessoas “percebe que esse discurso está a crescer” que vai ficando “meio escancarado nas falas”.
O que se falava antes “de uma forma muito velada”, agora “está a começar a ganhar força e a palavra começa a ser falada sem muita ressalva”, concluiu.
A crise migratória, nomeadamente a do Mediterrâneo, onde as pessoas “são abandonadas à sua sorte, numa travessia que já matou tanta gente” tem também espaço na peça e ocupa um lugar na companhia que pretende “fazer frente ao avanço da extrema-direita e do discurso de ódio”. frisou.
“Porque o discurso de ódio mata”, enfatizou Marcelo Andrade, lamentando tratar-se de um fenómeno que atinge Portugal e toda a Europa.
“Na boca do tubarão” tem dramaturgia, encenação, cenário e figurinos de Marcelo Andrade. Fica em cena na Sociedade Filarmónica Recordação D’Apolo, na Ajuda, em Lisboa.
As récitas realizam-se no sábado e nos dias 24, 25 e 26 de maio. À quinta, sexta-feira e sábado, começam às 21:00, ao domingo, às 17:00.
A interpretar a peça estão Alexandra Marinho de Oliveira, Gabriella Hedegaard, Geraldo Monteiro, Gonçalo da Costa Ramalho, Lorena Garrido e Tiago Braz, com participação especial de Camilo Bevilacqua.
A banda sonora é de Felipe Maciel e as fotos e vídeos de keise.
*** Serviço áudio disponível em www.lusa.pt ***
*** Cláudia Páscoa, da agência Lusa ***
CP // MAG
By Impala News / Lusa
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