Maior procura por consultas de alcoologia reflete maior consumo de álcool

A procura de consultas de alcoologia tem vindo a aumentar, reflexo do maior consumo de álcool em Portugal, onde os homens continuam a ser os principais consumidores, mas os jovens e as mulheres também estão a beber mais.

Maior procura por consultas de alcoologia reflete maior consumo de álcool

“Há muitas pessoas a procurar consultas para tratar as perturbações do uso do álcool, dentro das quais a dependência”, disse em entrevista à agência Lusa a nova presidente da Sociedade Portuguesa de Alcoologia, Joana Teixeira.

Segundo a também coordenadora da Unidade de Alcoologia e Novas Dependências do Centro Hospital Psiquiátrico de Lisboa, existe neste momento uma lista de espera para as consultas, porque “cada vez há mais casos”.

“Não só novos casos que vão surgindo”, e a pandemia potenciou bastante esse aparecimento, “mas também casos antigos de doentes que até estavam estabilizados e que na pandemia acabaram por ter uma recaída (…) e isso obviamente que aumenta o nosso tempo de espera para marcação”, explicou.

Questionada sobre a adesão à intervenção terapêutica, a psiquiatra disse que “é muito positiva” quando os doentes entram em tratamento.

“Os resultados do tratamento também são bastante positivos e, portanto, em termos de resposta terapêutica, eu diria que é bastante eficaz. A questão é até lá chegar”, disse, observando que dos cerca de um milhão de portugueses com perturbações do uso do álcool, menos de 10% estão em tratamento: “90% de pacientes com patologia sem ter tratamento é terrível”.

Joana Teixeira explicou que as perturbações do uso do álcool incluem todas as doenças que estão a provocar já danos na saúde física e mental do indivíduo, defendendo, por isso, que “tem que haver uma redução dos consumos”.

A maior parte dos doentes com dependência de álcool são homens (80%), mas está a registar-se um aumento de consumos nas mulheres e nos jovens.

“Nos jovens em episódios de ‘binge drinking’ [consumo de várias bebidas numa ocasião] e um início de consumos cada vez mais precoce”, disse, referindo que jovens de 12, 13 anos já se encontram muitas vezes a consumir, pelo menos nos últimos 12 meses, uma bebida alcoólica.

Relativamente às mulheres, a psiquiatra explicou que, normalmente, têm quadros de dependência por volta dos 40 anos, em média, e ao contrário dos homens, muitas vezes consomem em contexto secundário, na sequência de uma depressão, de uma perturbação de ansiedade ou um qualquer acontecimento de vida que faz com que fiquem mais deprimidas e acabam por se automedicar com o consumo de bebidas alcoólicas.

Nos homens, há habitualmente dois padrões de consumo: Os que bebem desde jovens quantidades muito elevadas, em cujas famílias há normalmente uma carga genética elevada, e depois os consumidores com cerca de 40, 50 anos que começam a manifestar esta doença, mas que se encontram socialmente integrados.

“Normalmente são pessoas até com escolaridade média alta, que têm um contexto familiar estável e que, portanto, não será desde logo muito evidente [que bebem] se não houver um rastreio, portanto, uma pergunta efetiva sobre o tipo de consumos que apresentam”, explicou a psiquiatra.

Ressalvou, contudo, que “as manifestações clínicas desta doença variam muito”, sendo “muito difícil” de encontrar um quadro típico único.

A especialista alertou que, no caso dos homens, consumir mais de três unidades de álcool por dia aumenta o risco de vir a desenvolver uma doença e nas mulheres mais de duas, mas advertiu que “não há um consumo isento de risco e também não há uma fronteira a separar o consumo dito normal, sem risco, e o consumo patológico que provoca dano”.

Além das consultas de alcoologia, as comunidades terapêuticas são um recurso essencial no tratamento dos doentes com dependência de álcool grave quando não respondem aos tratamentos de ambulatório.

“São valências que têm que estar disponíveis e em funcionamento para podermos referenciar os doentes quando é necessário”, mas, por vezes, há dificuldades no encaminhamento por questões burocráticas.

À frente de uma Unidade de Alcoologia, Joana Teixeira contou que há situações de doentes em internamento de agudos para desintoxicação e que necessitam depois de alta hospitalar de ir para uma comunidade, mas muitas vezes há todo um conjunto de procedimentos que são necessários para que o encaminhamento seja feito, que acaba por demorar dois meses”.

“Depois há o dilema entre dar alta ao doente para o ambulatório, ficando a aguardar a vaga na comunidade terapêutica, ou ficarmos com ele em internamento até termos a vaga na comunidade terapêutica”, afirmou, sublinhando que o custo maior para a saúde é perder o doente ou este voltar a ter uma recaída enquanto aguarda pela comunidade terapêutica.

Segundo a especialista, as comunidades e as entidades competentes responsáveis pelas autorizações necessárias para o processo têm isso em atenção e tentam agilizar um pouco mais o processo, mas demora sempre, pelo menos, um mês, sendo necessária “uma resposta mais rápida” quando os doentes estão em internamento a aguardar a entrada.

HN // FPA

By Impala News / Lusa

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