Voto obrigatório. Um debate que se impõe [Paulo Vieira da Silva]
Nos últimos actos eleitorais a abstenção tem aumentado de forma inaudita. Nas últimas eleições Legislativas a abstenção foi de 51,43%. Mais de metade dos portugueses tomaram a decisão de não exercerem o seu direito de voto
Nos últimos actos eleitorais a abstenção tem aumentado de forma inaudita. Nas últimas eleições Legislativas a abstenção foi de 51,43%. Mais de metade dos portugueses tomaram a decisão de não exercerem o seu direito de voto por quem tantos, antes de nós, lutaram arduamente.
É notório que a abstenção tem funcionado como uma forma de protesto face aos políticos que têm governado o nosso país.
Porém, o distanciamento dos cidadãos não é um fenómeno recente, muito menos um problema que afecte apenas o nosso país. Por exemplo, nas últimas presidenciais norte-americanas quase metade dos eleitores não participaram nas eleições. O problema da abstenção tem raízes profundas, que vão desde o crescente descontentamento com os políticos que temos até ao desinteresse pelo fenómeno político, pelo que não existe uma solução mágica para o resolver.
A abstenção e os votos brancos ou nulos têm-se revelado uma forma de protesto completamente inútil e ineficaz.
Os partidos políticos não perdem um minuto com os cidadãos que não votam, nem com aqueles que votam branco ou nulo.
Os partidos políticos ignoram completamente a abstenção e os votos brancos ou nulos porque em nada os afecta.
As elevadas taxas de abstenção e o crescente número de votos nulos ou brancos não mudaram em nada o modo de funcionamento dos partidos políticos, nem a ética e a moral dos políticos nos últimos anos.
Também está mais do que provado que os partidos políticos nada fizeram para contrariar o fenómeno crescente da abstenção e dos votos brancos ou nulos.
É suficiente reparar que na última noite eleitoral todos os partidos políticos mostraram uma grande preocupação com a elevada taxa de abstenção, mas entretanto passaram mais de 10 dias e nem mais uma palavra ouvimos sobre o tema.
Esta é a nossa realidade. Mas existe uma outra realidade. A do voto obrigatório. Em vários países democráticos e desenvolvidos – como a Austrália, a Bélgica e o Luxemburgo, entre outros –, votar é obrigatório e são penalizados com coimas os cidadãos que não votam.
Barack Obama, o ex-presidente dos EUA, é um entusiasta do voto obrigatório. Obama afirmou mesmo que «seria verdadeiramente transformador se toda a gente votasse», referindo-se ao caso da Austrália, onde a afluência às urnas supera os 90%.
Sr. Presidente da República, faço-lhe o apelo para que lidere este debate sobre o voto obrigatório
Também no nosso país são vários os ilustres juristas que defendem o voto obrigatório. O fundador e antigo líder do CDS, Professor Diogo Freitas do Amaral, recentemente falecido, defendia o voto obrigatório «como forma de eliminar a abstenção e até de motivar os jovens a participarem na vida cívica e política portuguesa», sublinhando que o mesmo «não tem nada de antidemocrático», questionando até que «se a vacinação e o seguro automóvel são obrigatórios em Portugal por que é que o voto, que define o que vai ser o nosso país, não pode ser obrigatório».
Também o actual Presidente da República, Professor Marcelo Rebelo de Sousa, já fez a defesa o voto obrigatório. Hoje ninguém melhor do que Marcelo Rebelo de Sousa tem condições políticas para lançar este debate junto dos partidos políticos com representação parlamentar e dos portugueses.
Entendo que o voto obrigatório deverá ser sempre entendido como medida de combate à elevada abstenção e de aproximação dos cidadãos à discussão política. Porém, a implementação do voto obrigatório deverá ser alvo de um amplo debate porque matérias como esta devem recolher consenso alargado dos portugueses.
Por sua vez, é premente avançar com a possibilidade de um cidadão poder votar em qualquer local do País, aproveitando as novas tecnologias. A possibilidade do voto antecipado teve agora larga adesão. É necessário continuar a dar passos firmes no sentido de facilitar o voto aos eleitores.
Porém, esta evolução não parece suficiente para contrariar o fenómenos crescente da abstenção.
Até onde será preciso subir os níveis de abstenção para se lançar o debate sobre o voto obrigatório?
Sr. Presidente da República, Professor Marcelo Rebelo de Sousa, faço-lhe o apelo para que lidere este debate sobre o voto obrigatório antes que seja tarde, até porque não quererá correr o risco de ser reeleito numa eleição com abstenção recorde.
Paulo Vieira da Silva é Gestor de Empresas / Licenciado em Ciências Sociais – área de Sociologia
(Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico)
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