Todos temos um João Braga dentro de nós

Todos temos um João Braga dentro de nós: todos temos medo da diferença, do desconhecido. Todos tememos o que não compreendemos.

Todos temos um João Braga dentro de nós

Passaram cerca de 36 horas desde que João Braga, provavelmente enfadado por não ter sido convidado para animar uma qualquer festa de Carnaval, se lembrou de botar faladura no megafone do mundo, o Facebook.

“A distribuição dos Trumps – Agora basta ser-se preto ou gay para ganhar os Óscares”, escreveu o fadista de 71 anos que, sendo pai, avô e, mais importante do que tudo neste contexto, figura pública, já tinha idade para ter juízo.

A coisa explodiu, sucederam-se os comentários, a troca de insultos, as ameaças, com João Braga a contribuir para o nível degradante da discussão, atirando impropérios contra os seguidores que me escuso de reproduzir aqui. Não que me choquem mas porque não acho que valha a pena.

A “cubata” e o “armário”

João Braga terá ficado incomodado quando, na madrugada de segunda-feira, viu atores, produtores e realizador de Moonlight (todos afro-americanos) subirem ao palco do Kodak Theatre e surripiar o Óscar dos colegas de La La Land (todos caucasianos). Terá ficado incomodado João Braga e terão ficado milhares como ele. Os milhares silenciosos que pensam como João Braga mas que, tendo medo e/ou bom senso, se remetem ao silêncio e preferem cuspir bílis racista e homofóbica nas conversas de café, com a família, os amigos, em frente aos filhos.

Todos temos um João Braga dentro de nós: todos temos medo da diferença, do desconhecido. Todos tememos o que não compreendemos. Sentirmo-nos fora da nossa zona de conforto é complicado. No caso de João Braga deve ser complicado viver num mundo onde – e vou citar as declarações que concedeu à Flash, os pretos “saem da cubata” e os homossexuais “saem do armário”.

Deve ser complicado e angustiante, de facto. É por isso que não sinto nem raiva nem ódio de João Braga. Sinto compaixão. Sinto sempre compaixão por quem se fica, emperdenido, fechado, em pequenos ódios, em preconceitos. Sinto compaixão por quem não tem a capacidade (e é um processo doloroso, de auto-questionamento) de abrir o coração ao mundo, à mudança. Sinto compaixão por quem fica acabrunhado, fechado num canto, tremendo perante a visão de um mundo que “pula e avança/ como bola colorida / entre as mãos de uma criança”, citando António Gedeão.

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Raquel Costa | Jornalista

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