No teu poema existe um verso em branco e sem medida, Simone

Simone de Oliveira é mais do que a figura que se vê na televisão. É a paixão do homem comum e a admiração da mulher acanhada no seu cantinho da sociedade.

No teu poema existe um verso em branco e sem medida, Simone

Das canções de Simone de Oliveira, será eventualmente No Teu Poema uma das que melhor a definem. Versos como “A dor calada lá no fundo / O passo da coragem em casa escura / E aberta, uma varanda para o mundo” ou “O risco, a raiva, a luta de quem cai ou que resiste / Que vence ou adormece antes da morte” parecem riscos de um desenho de palavras para desenhá-la por dentro, onde reside o nosso íntimo.

Simone de Oliveira não é a figura que a gente vê em novelas. Nem a que está nos palcos a ser aplaudida ou a que agradece um elogio ou as honras públicas de por duas vezes ter sido condecorada, em 1997 por Jorge Sampaio e em 2015 por Cavaco Silva. Simone de Oliveira é aquele poucochinho de poema e o desabafo que aqui se transcreve, no final desta crónica, antes da voz dela.

Para lá de Património classificado, Simone é o que está escrito em milhares de artigos, biografias, histórias passadas entre as bocas da gente da Cultura. E é a paixão do homem comum e a admiração da mulher acanhada no seu cantinho da sociedade. Simone, que neste 11 de fevereiro passa a ter 79 anos completos, é a voz quente que te pede “dá-me aí um cigarro, filho” ou te diz “fuma à vontade” quando já te sentes sóbrio do embate de te sentares em casa dela.

A inconfidência deste jornalista que se sentiu filho no colo de uma tão grande mulher, na própria casa dela – “A minha Pátria é a minha Língua. Esta merda que a gente tem cá dentro, como costumo dizer” (Simone de Oliveira)

Além da entrevista que publicaremos dia 11, fica a inconfidência deste jornalista que se sentiu filho no colo de uma tão grande mulher, na própria casa dela, que nunca há de deixar de ser a casa dela e do Varela – sentado na escrivaninha junto à janela onde hoje há um plasma a transmitir televisão vazia a fumar pensativamente. Este texto será muitíssimo mais um exercício de vaidade do que outra coisa, mas tinha de ser porque o que muitos não sabem é que o jornalista tem um outro privilégio; coisas que lhe dizem e que ele não publica enquanto desempenha a profissão.

Coisas como esta que, afinal, não podem ser apenas do jornalista porque o Património é de todos: – (…) a Língua também é a Pátria. Está de acordo, Simone?

– Estou completamente de acordo consigo. A minha Pátria é a minha Língua. Esta merda que a gente tem cá dentro, como costumo dizer. Porra! Que chatice, pá! E depois a gente vê o mar e diz assim: pá, ninguém tem este mar assim. Ninguém tem esta puta desta terra, pá! E depois amamo-la mal, passamos pelas coisas, nem damos por elas. Olhamos uns para os outros e só falamos pelo Twitter e pelo coiso. Já não olhamos, não dizemos coisas… Não! Depois fazem tudo atrás da porta. Ou então fazem tudo na televisão… Oh, Diabo, lá estou eu!

Luís Martins

Luís Martins | diretor

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