“Coração partido” na adolescência pode assumir contornos patológicos

Artigo de Opinião de Maria Laureano, pedopsiquiatra da UPPC

“Coração partido” na adolescência pode assumir contornos patológicos

Maria Laureano

 

Artigo de Opinião de Maria Laureano, pedopsiquiatra da UPPC

 

Todos nós reconhecemos o momento em que um adolescente começa a passar mais tempo em frente ao espelho antes de ir para a escola. Quando regressa e só deseja passar todo o tempo possível ao telemóvel, em conversas intermináveis, ora com alguém a quem habitualmente inventam um nome, ora com os melhores amigos a quem pedem conselhos. Os olhos começam a brilhar mais, ficam mais energéticos, mas ao mesmo tempo mais “aluados”. Neste momento, não há dúvidas – o amor chegou.

Muitos pais sentem-se confusos com a chegada, quase sempre inesperada, do primeiro amor real e intenso do adolescente. Por um lado, ficam felizes porque sabem o quão especial é sentir o amor. Por outro, antecipam o sofrimento emocional que poderá daí vir, e muitas vezes querem-no evitar ou minimizar.

É sabido que a adolescência traz com ela vários desafios do desenvolvimento individual e psicossocial, onde se inclui o processamento de emoções intensas, em particular as desencadeadas pelos “primeiros amores”. A capacidade de se apaixonar e de se envolver numa relação amorosa é um importante marcador do desenvolvimento, quer identitário, quer da intimidade com o outro.

Ao longo do crescimento dos nossos filhos, não é raro focalizarmos a atenção na sexualidade. Talvez por se manifestar primeiro. Talvez por ter consequências sentidas como perigosas (doenças sexualmente transmissíveis, uma gravidez indesejada). A verdade é que, as consequências emocionais podem ser igualmente perigosas.

É importante educarmos para os afetos. São estes o que nos liga ao outro, o que sustenta o mundo de relação. As primeiras relações amorosas permitem o início da aprendizagem e treino do que implica e necessita uma relação de intimidade com o outro. Contudo, o tempo de vida do “primeiro amor” é habitualmente limitado e o seu fim quase sempre desencadeia momentos críticos, na vida do adolescente.

O fim de uma relação amorosa nunca é fácil, nem simples diria, independentemente da idade. Porém, para os adolescentes pode ser particularmente devastador. Os adolescentes, em particular na segunda etapa da adolescência (entre os 13-15 anos), tendem a equiparar os relacionamentos afetivos românticos com a aceitação social no grupo de pares. Assumem que quem tem relações afetivas românticas são indivíduos com maior maturidade e mais desejáveis do ponto de vista social. Não é incomum observar, que quando um adolescente termina uma relação amorosa se sente socialmente excluído. Em parte, porque muitas vezes houve um grande investimento no par amoroso, levando a um afastamento do grupo de amigos, ou por procurarem ativamente evitar determinados momentos sociais onde têm receio de reencontrar o ex-par amoroso.

Em paralelo, estes experienciam estados emocionais intensos, por vezes, pautados por sentimentos de fracasso, rejeição e abandono. Associadamente podem surgir sintomas físicos de diminuição de energia, apatia, dificuldade em retomar atividades rotineiras, alteração do apetite e do padrão de sono.

Estes sintomas e dificuldades vivenciadas podem apenas constituir reações de ajustamento transitórias ou podem assumir contornos patológicos, com o surgimento de Perturbações do Sono, Perturbação de Ansiedade, Episódios Depressivos (pontualmente associados a alteração do pensamento com conteúdos delirantes ou alteração da perceção da realidade) ou Comportamentos Autolesivos. São momentos críticos vividos pela família, em que alguns pais lidam com o difícil sentimento de impotência em proteger os filhos.

Como podemos ajudar? Ouvir de forma empática, sem críticas ou julgamentos é o melhor que podemos fazer por eles. Recordarmos os sentimentos e as dificuldades sentidas quando nos encontrávamos nesse papel, pode ajudar-nos a ser um apoio forte. Ainda assim, nem sempre é suficiente e por vezes é necessário recorrer a ajuda clínica especializada. Nesses casos, o importante é procurar clínicos na área da saúde mental que tenham experiência com adolescentes, pois estes saberão fazer a distinção entre situações normativas e patológicas, e destas as que beneficiam com intervenção psicoterapêutica.

A Unidade Psiquiátrica Privada de Coimbra tem por missão contribuir para o bem-estar da população através da oferta de cuidados de saúde, de atividades de formação e de investigação, na área da Psiquiatria e saúde mental, de acordo com padrões de referência internacionais. Para mais informações consulte: http://uppc.pt/

 

 

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