Doente renal dá a volta ao mundo com a família: «Somos melhores pessoas agora»

O facto de fazer hemodiálise três vezes por semana não travou o sonho de Filipe Almeida de desbravar o mundo na companhia da mulher e do filho. Viajaram durante oito meses e regressaram a Portugal por uma causa maior: «Vamos ter mais um bebé». Em 2020, esperam concluir a rota traçada inicialmente, já com mais um elemento.

Em 2019, Filipe Almeida e a mulher, Catarina, venderam todos os bens. Despediram-se da família e dos amigos e iniciaram uma volta ao Mundo na companhia do filho, Guilherme, de ano e meio. O facto de fazer hemodiálise três vezes por semana não travou Filipe, que regressou a Portugal ao final de oito meses por uma causa maior. «Vamos ter mais um bebé.» O casal descobriu que o clã ia aumentar quando estava em Bali, na Indonésia. «Foi feito algures entre Abu Dhabi e Dubai. Os enjoos começaram em Taiwan e a primeira ecografia em Banguecoque», contam, divertidos, enquanto Filipe refere ao Portal de Notícias que esperam prosseguir viagem ainda este ano e concluir a rota traçada inicialmente. «Aprendemos a não fazer planos a longo prazo e tem sido muito bom viver a vida um dia de cada vez.»

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«Deixámos o medo de lado e aprendemos a superá-lo»

Com nefropatia por IGA diagnosticada aos 12 anos, Filipe Almeida encara a doença renal de forma descomplicada, servindo de inspiração para muitos pacientes. Nos últimos oito meses, viajou por 24 países e fez 332 horas de tratamentos durante 83 sessões de hemodiálise em 49 cidades. Com isto, provou que a assistência médica aos doentes renais está ao alcance de todos em qualquer parte do Planeta, no âmbito do Sistema Nacional de Saúde, e que questões relacionadas com as reservas de tratamentos em clínicas noutras localidades são tratadas de forma simples através de um programa diálise em férias. Embora com algum receio, seguiu em frente.

«Deixámos o medo de lado e aprendemos a superá-lo e a não pensar muito nele. Devemos arriscar mais, viver mais, aproveitar mais os dias. Sempre tomámos as nossas decisões com base na segurança e nunca fizemos algo que a colocasse em causa», afirma Filipe, sublinhando que é importante saber que «existem empresas especializadas em tratamentos de hemodiálise pelo Mundo com excelência médica transversal, ao dispor de qualquer pessoa, e apoio logístico na marcação dos tratamentos, o que ajuda transpor a barreira da distância e da língua. Dá-me confiança poder contar com isso».

Medicação na bagagem e atenção às análises

 

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Kaoshiung é uma pequena cidade, a sul. Além dos nossos amigos, só moram cá campos de ananás e algumas lendas e histórias. O vermelho é a cor predominante e transmite-nos a força dos tigres e dos dragões por aqui plantados. Há nenúfares maiores do que alguma vez vimos e há cheiro a incenso e a rituais. Nas ruas há uma confusão organizada e as motas têm regras diferentes dos outros países. Acordamos sempre com muita vontade de explorar e de ver mais do que aquilo que o tempo nos permite. Somos gratos por vivermos esta cultura a três. Quando pensam em Taiwan, o que vos vem à cabeça? . . #kaohsiung #lotuslake #lotuspond #taiwan_dream #taiwan_tourism #exploretaiwan #travelwithkids #ilovetaiwan #fujifilmxpt

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Paralelamente, este empresário nunca se esquece, claro, de levar medicação na bagagem e pede sempre para saber o resultado das suas análises, de forma a controlar os alimentos que ingere. Este autoconhecimento do corpo evitou sustos durante a viagem. «Depois de oito meses, voltámos com a farmácia de viagem intacta e nunca sequer foi preciso tomar um medicamento». Filipe nunca se sentiu limitado pela doença na adolescência. Fazia provas de Natação, jogava Futebol e praticava Surfe. Mas teve medo da morte quando um especialista lhe revelou que, aos 34 anos, iria começar a fazer hemodiálise. «Aí, sim, foi um choque!»

«Ficar condicionado a uma máquina para viver não era algo que queria para a minha vida»

«Se, por um lado, fiquei feliz por saber que mesmo sem funcionamento renal poderia continuar a viver, por outro, ficar condicionado tanto tempo dos meus dias a uma máquina para poder viver não era algo que queria para a minha vida. Depois, acabou por passar. Mas voltei a entrar em negação quando reparei que o meu corpo não funciona da mesma forma e que tinha de dar início aos tratamentos, muito antes daquilo que tinha sido projetado. Tinha aberto uma empresa há pouco tempo, investido tempo e dinheiro, estava a começar uma época boa no meu trabalho e a Catarina estava grávida de fim de tempo. Se fosse para acontecer, aquela altura não era a ideal. E ver-me limitado, nos primeiros dias, meteu-me alguma confusão. Dez dias depois, com o nascimento do meu filho Guilherme, tudo acabou por passar.»

«Percebemos que temos muito mais aos estarmos juntos e a criarmos memórias para a vida»

Foi com a mesma força e  determinação com que encararam a doença que Filipe e Catarina resolveram abandonar carreiras profissionais estáveis. Ele tinha uma empresa na área do turismo, ela trabalhava numa multinacional como team leader e venderam todos os bens para desbravarem o Mundo. «Tenho consciência de que é um ato de coragem. Não é uma decisão simples ficar sem nada e sem o conforto de um trabalho bem remunerado, independente, de uma casa e de uma vida organizados.  Ainda assim, não nos sentíamos 100% realizados. Trabalhávamos muitas horas, com horários rotativos, e sentíamos que a vida estava a passar-nos ao lado», conta Filipe.

 

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Em dias de diálise divido a cama com o Gui. Não quero saber o que está certo ou errado nas realidades à nossa volta. Ele preenche o lado da cama vazio e traz-me a tranquilidade e a companhia que sinto falta durante estas noites. Por outro lado, trago-lhe a segurança de que tudo estará bem e que, apesar de hoje sermos só dois, o pai está a ganhar vida para sermos para sempre três (ou mais). Para nós há muito que o politicamente correto ficou lá atrás e, se há coisas que jamais me irei arrepender, é de adormecer com o cheiro de bebé ao meu lado. Que se lixem as politiquices. Somos tão mais felizes assim… de que lado estão? Dormir ou não dormir com os filhos? . #santorinigreece #oiasantorini #oiasunset #oia #greece #greeceislands #travelfamilyblog #aroundtheworldpics #aroundtheworldtrip

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«Eu tinha uma doença, o Guilherme estava a crescer e sentíamos que tínhamos passado a vida toda a trabalhar, sem usufruirmos realmente da companhia uns dos outros. Percebemos que temos muito mais aos estarmos juntos e a criarmos memórias para a vida toda do que os bens materiais que nos enchem mais a carteira e o ego do que propriamente a alma. Somos pessoas melhores agora». As aventuras da família têm sido partilhadas em allaboardfamily, onde também constam as rotinas relacionadas com os vários tratamentos de hemodiálise, através de stories e de artigos no blogue.

Texto: Carla S. Rodrigues; Fotos: DR e Reprodução Instagram

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