Emily e James: O casal britânico cujo sonho foi destruído pelas chamas em Monchique

Conheça a história de Emily e James, um casal que veio de Londres para Monchique para cumprir um sonho e perdeu tudo no incêndio que deflagrou o Algarve.

Emily, de 27 anos, e James, de 29, deixaram Londres para em Portugal concretizar um sonho: construírem um retiro autosustentável para eles e para todos os que quisessem experimentar viver em tranquilidade e harmonia com a natureza. Apesar de estarem conscientes das dificuldades que iriam enfrentar no campo das saudades, o casal – que está junto à cinco anos – estava decidido em embarcar «nesta aventura juntos».

«Viemos para Portugal concretizar o nosso sonho de criar um retiro autosustentável. Ter uma vida simples, em harmonia com a natureza. Queremos cultivar os nossos próprios vegetais e construir a nossa casa», começou por explicar Emily ao nosso site.

Antes de se apaixonarem por Monchique, o casal esteve cerca de um ano a viajar por França, Espanha e Portugal numa caravana que remodelaram ainda em Inglaterra. Durante a viajem, Emily e James fizeram trabalho voluntário em várias quintas para adquirem conhecimentos sobre agricultura e autosustentabilidade, enquanto, ao mesmo tempo, procuravam o local perfeito para criarem o retiro.

E foi na serra algarvia que o casal decidiu materializar o seu sonho. «Chegámos a Portugal há dois anos e adorámos a tranquilidade que se vive aqui. Decidimos comprar um terreno em Monchique e há mais ou menos um ano assinámos os papéis e tornámos-nos proprietários do nosso pedacinho de terra no Algarve», contou.

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Mal obtiveram o terreno, o casal começou logo a trabalhar na limpeza e construção da casa. «Estávamos muito entusiasmados e, por isso, tínhamos muita energia. Primeiro limpámos a terra e depois, ao fim de quatro meses, terminámos de construir a casa. Em dezembro, já lá estávamos a viver», garante a jovem britânica.

Emily é formada em Belas-Artes e James era fotógrafo em Londres. Contudo, para terem forma de financiar o seu projecto, Emily começou a cuidar de idosos e James descobriu uma nova paixão: a carpintaria. James chegou a construir uma pequena oficina na casa. Orgulhosa, Emily garante que o seu parceiro foi quem construiu todas as janelas e portas da habitação.

O início do fim: A chegada do fogo e da incerteza

Foi na sexta-feira, dia 3 de agosto, quando Emily estava a voltar de uma semana fora de casa a cuidar de idosos em Odemira, que percebeu a gravidade das chamas que tinham começado a lavrar a serra de Monchique. À medida que se aproximava de casa, Emily constatou que o fogo estava perto da sua habitação, onde estava James sem carro ou telemóvel.

«Comecei a ver fumo e percebi que estava perto da nossa casa. Sabia que o James estava lá, sem carro e sem telefone, e fiquei muito preocupada. Comecei a conduzir muito rápido para chegar lá o mais depressa possível. Só queria saber que ele estava bem», recorda.

Quando chegou à propriedade, James estava bem e o incêndio ainda não tinha chegado ao terreno. No entanto, o casal, juntamente com um vizinho, decidiu subir de carro até ao topo do vale para ter uma noção da situação que enfrentavam. Dezenas de veículos dos bombeiros já se encontravam no local e as autoridades estavam a cortar várias estradas e a impedir a passagem. «Percebemos que já era uma grande operação». O casal acabou por não poder regressar a casa.

Só no dia seguinte foram avisados pelos bombeiros que já estava «aparentemente controlado» e que podiam regressar a casa.

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«Já em casa, passadas umas horas, começámos a perceber que se passava algo de errado outra vez. Imensos veículos dos bombeiros circulavam para cima e para baixo e havia cada vez mais helicópteros. Percebemos que estava a ficar caótico e crítico outra vez», lembrou.

Emily e James decidiram fazer as malas e prepararam-se para o pior. Momentos depois, um vizinho português que mora a cerca de dois quilómetros, surgiu em alvoroço. O homem afirmou que tinham de fugir naquele momento, que tinham de se despachar e partir imediatamente.

O casal agarrou nos poucos sacos que tinha conseguido organizar, colocou os cães no carro e seguiu caminho. «Foi a última vez vimos a nossa casa antes de ser consumida pelas chamas».

Do cansaço ao choque: Um sonho em cinzas

Emily e James partiram para casa de uns amigos em Casais até terem notícias. Mas o pesadelo não ia terminar ali. Uma noite depois tiveram de fugir novamente das chamas porque o fogo começou a expandir-se também para aquela zona, que fica a cerca de 10 quilómetros do centro de Monchique. O casal acabou por ter dormir durante umas noites numa tenda emprestada, em Aljezur.

«Foram uns dias muito difíceis. Estávamos cansados, a dormir em tendas, sempre preocupados sem saber o que tinha acontecido à nossa casa», confessou.

Na manhã de segunda-feira, dia 6 de agosto, o casal pôde regressar finalmente a casa. O cenário que os esperava deixou-os em «choque»: «Foi horrível. Não queríamos acreditar no que estávamos a ver. Estava tudo reduzido a cinzas. Comecei a sentir-me mal, a sentir-me doente. Estava tudo preto e branco. Ficou tudo destruído», garantiu.

Cansados, tristes e sem nada, Emily e James não puderam ficar no terreno, tendo em conta que as cinzas são tóxicas. O casal encontra-se agora a viver numa casa no centro de Monchique. «Uns amigos ofereceram-nos uma casa para ficarmos até nos organizarmos. Já é uma grande ajuda».

 O renascer das cinzas: «Queremos ver a natureza prosperar outra vez»

Abalados e desmotivados, Emily e James não viam grandes perspectivas de futuro nos dias que seguiram ao incêndio. Contudo, a família e os amigos do casal conseguiu devolver-lhes a esperança e a força para recuperar da trágica situação.

Há cerca de uma semana, a mãe de Emily criou uma campanha de angariação de fundos na plataforma online «Go Fund me». Explicando a história da filha, a progenitora pediu ajuda a todos para que o casal conseguisse recuperar o sonho perdido. O resultado? Em poucos dias, a campanha já arrecadou mais de cinco mil euros, doados por cerca de 95 pessoas.

«[A angariação de fundos] Foi algo que ajudou a levantar a nossa moral. Todo o amor e apoio que temos recebido tem sido incrível. Fez-nos sentir que não estamos sozinhos», revelou.

Apesar de o trauma vivido, o casal decidiu que vai ficar em Monchique e quer ajudar a recuperar a localidade. «Queremos muito reconstruir e recuperar o nosso terreno e casa. Não nos iríamos sentir bem se nos fossemos embora e abandonássemos a terra. Nós importamos-nos realmente, não só com a nossa propriedade, mas também com a localidade e o país. Queremos ajudar a regenerar a região e ver a natureza prosperar outra vez», explicou.

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Emily e James querem ainda encontrar soluções viáveis que ajudem a prevenir os incêndios na zona. «Tendo em conta que os eucaliptos têm demonstrado ser um problema, gostávamos muito de ajudar e estamos a tentar perceber com quem nos podíamos encontrar para fazer projectos para replantar outras árvores. Queremos pensar noutras soluções económicas que não envolvam a produção de eucaliptos», concluiu.

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Texto: Mafalda Tello Silva     Imagens: Cedidas por Emily Ross

 

 

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