Polícia dispersa manifestação de estudantes no centro de Maputo
Trinta estudantes responderam hoje à convocatória nas redes sociais para uma manifestação no centro de Maputo contra o novo Estatuto do Funcionário e Agente Parlamentar, tendo sido dispersos por polícias armados.
Devido à crise no país, as regalias e subsídios previstos no estatuto estão a ser alvo de críticas desde que foram aprovados pela Assembleia da República (AR) na generalidade e por consenso na última semana, estando marcada para quarta-feira a discussão na especialidade no parlamento. “Não ao roubo legalizado”, “Gangsters de fato” eram frases entoadas em voz alta no centro de Maputo e que se liam nalguns cartazes, enquanto outro sugeria: “Que tal mais regalias para Cabo Delgado?” – onde mais de 2.500 pessoas já morreram e há 714 mil deslocados numa crise humanitária causada por confrontos armados com rebeldes.
“Não é proibido manifestarem-se, peçam autorização e serão autorizados”, disse um polícia, ao travar a marcha dos estudantes, referindo que “enquanto não a tiver”, o grupo não deve promover nenhuma manifestação. A concentração deu-se pelas 08h30 (07h30 em Lisboa) na Rua da Rádio, ao lado da Praça da Independência e da maior estátua do ex-Presidente Samora Machel, em frente ao edifício do Conselho Municipal de Maputo.
“É um direito” protestarem, disse outro polícia, mas “existem regras. Cumpriram-nas”, questionou, com o grupo a argumentar que tentou obter uma autorização, mas sem a conseguir em tempo útil. O número de polícias empunhando armas na praça chegou a superar o de manifestantes que, após dois momentos de diálogo com as autoridades, fecharam os cartazes e resolveram circular, sempre seguidos por agentes.
Estudantes de Maputo rodeados por cães-polícia
A determinada altura, quando caminhavam juntos pela Avenida Josina Machel, os jovens e estudantes chegaram a ser rodeados por cães-polícia, numa ação que gerou críticas. “Mas que polícia é essa”, perguntou uma das integrantes no grupo, antes de novo momento de diálogo, após o qual os manifestantes terminaram o protesto. “Vamos dispersar, vamos caminhar e fechem os cartazes também”, disse Viriato Matine, 31 anos, licenciado em Filosofia pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM) e um membro do grupo que apelou à calma e ao protesto pacífico.
Ao lado, Duarte Amaral fazia um ponto de ordem: “A nossa luta é também por eles, polícias”, referiu o estudante de 27 anos da UEM, formado em Filosofia. “Esta luta é por Moçambique, é pelos polícias também” porque no parlamento são aprovadas regalias, “mas há dois anos que se nega um aumento de salário mínimo” ao resto da população, realçou. Na convocatória para a manifestação, que circulou nas redes sociais, na segunda-feira, a Comunidade de Estudantes da UEM marcava uma “manifestação pacífica contra as regalias exacerbadas aprovadas pela AR”.
“Esperamos que ao assistir a esta manifestação, os deputados coloquem a mão na consciência” e revertam a aprovação da lei, disse Alberto Matola, 25 anos, aluno de Ciências Políticas da Universidade Eduardo Mondlane. O estudante e os restantes lamentaram a ação da polícia. “Isto é um espaço público, mas estamos a ser censurados. Dizem que as pessoas não podem ficar paradas, que se querem ficar por aqui, têm de circular. Estamos a ser censurados muito cedo. Isto é mais para desencorajar os jovens, mas nós não vamos parar”, sublinhou.
“Queremos sair das redes sociais e ir para as ruas” face a um parlamento que aprova leis com as quais “a juventude não se identifica”. “Vamos começar hoje, mas se não houver resultado imediato, prometemos voltar a fazer alguma cosa. Não vamos parar até que se chumbar a lei”, disse. O estatuto aprovado na generalidade é contestado por prever regalias numa altura de crise e restrições impostas pela pandemia de covid-19, num dos países mais pobres do mundo, que enfrenta ainda uma insurgência armada no norte, em Cabo Delgado – conflito que levou à suspensão do projeto de gás natural em que residiam muitas das esperanças para relançamento da economia.
Entre as regalias, está um novo “subsídio de atavio” para funcionários e agentes parlamentares poderem adquirir roupas e adereços necessários ao protocolo de cerimónias em que participem. O ministro das Finanças, Adriano Maleiane, citado pelo jornal O País, estima que as regalias custem ao Estado o equivalente a cerca de 1,5 milhões de euros, condicionado a sua aplicação à existência de cabimento orçamental.
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