Supernanny: «Que pais trocam os direitos dos filhos por mil euros?»

Passados quatro meses, o processo movido pelo Ministério Público contra a SIC está perto do fim. No entanto, Supernanny continua a gerar polémica.

Bastou a transmissão de dois episódios do formato Supernanny para que o programa da SIC se tornasse o assunto mais falado em Portugal.

Desde fevereiro que a estação de Carnaxide está a ser julgada no Tribunal de Oeiras. Em nome de seis menores de três famílias diferentes, o Ministério Público saiu em defesa dos direitos das crianças e jovens que participaram no formato apresentado pela psicóloga Teresa Paula Marques. SIC, Warner Brothers e pais são acusados de «humilhar», «estigmatizar», e de «violar direitos de personalidade dos menores».

Depois de quatro meses de depoimentos, de psicólogos contra psicólogos  e «muitas opiniões», o julgamento da Supernanny está perto do fim. Nas alegações finais, a 26 de junho, o Ministério Público (MP) pediu a suspensão provisória do programa e SIC exigiu a defesa da liberdade de expressão.

Ministério Público dá ‘ralhete’ a pais: «Os filhos não são coisas que os pais podem dispor»

Luísa Sobral, a procuradora do MP, defendeu assim que esta suspensão provisória seja convertida numa decisão definitiva para todas as crianças selecionadas para o programa. A procuradora considerou que a defesa dos menores é uma legitimidade interventiva do Ministério Público português.

«Que pais trocam os direitos dos filhos por mil euros?», questionou Luísa Sobral

Tendo em conta que, segundo a procuradora, no espaço europeu não existe outro Ministério Público que tenha uma intervenção legitimada como tem o português, «a unidade do sistema jurídico português ficaria mal e seria incorreto que não tivesse atuado na defesa do superior interesse destas crianças». Luísa Sobral considera que o programa é lesivo para as crianças, que há um dever do Estado em protege-las e que o MP faz uma intervenção em representação das crianças «quando os pais não assumem uma proteção séria colocando-os em risco» ao permitir «a exposição pública da sua intimidade».

«A lesão destes direitos já está consumada. A humilhação, a estigmatização e a pegada digital são irreversíveis. Não estamos a analisar se as crianças são bem comportadas ou não», afirmou a procuradora.

O MP ainda acusou a SIC de não ter como prioridade «o bem estar e educação das crianças». Pelo contrário, a procuradora acusa a estação de televisão de colocar os menores em «segundo plano» e de as instrumentalizar para ter «mais visualizações e audiências». «O que interesse se é um reality show ou um documentário? Este programa fez uma selecção cirúrgica para encontrar crianças instáveis, birrentas e descontroladas».

«É isto que o público gosta? É sim, gosta de perturbações alheias, de espectáculo de fragilidades. É isso que dá visualizações e aumento de audiências. Os spots promocionais são aperitivos», declarou o MP.

SIC diz que Ministério Público é «incompetente»

A defesa da SIC nas alegações finais do julgamento defendeu que não existe uma norma legal que permita ao MP intentar a ação judicial contra a estação de televisão e os pais. O advogado da SIC neste processo, Tiago Félix da Costa, disse que «há normas legais para restringir as responsabilidades parentais, mas não há uma norma que permita dizer ou impor o que se pensa».

«O MP é incompetente para este processo. Não tenho dúvidas disso. Só pode representar menores quando os pais estiverem impossibilitados de o fazer. Isto demonstra arrogância moral por parte do MP. ‘Que pais são estes?’ Eu até posso não gostar deste programa mas isso é uma opinião», disse Tiago Félix da Costa.

«Não há normal legal que permita ao MP intentar ação de tutela da personalidade contra a SIC e os pais em substituição dos próprios pais», frisou.

O representante legal da SIC ainda reforçou que os próprios especialistas que testemunharam a favor do MP apenas deram «opiniões» e que não foi apresentada qualquer «prova de um dano». «Prova concreta ou potencial não existe. O indício que existe é a opinião do MP»

«Este é um dos processos mais importantes para a democracia portuguesa. É um processo sobre liberdade, sobre saber até onde o estado pode agir, sobre liberdade de programação, liberdade de expressão e liberdade de educar. Este processo é uma ameaça à liberdade protegida pela Constituição. Os pais têm o direito e o dever de educar como querem os seus filhos. O paternalismo leva a tirania.

Por fim, o Tiago Felix da Costa apelou à juíza Alzenda Pires para ter em conta o «impacto que a decisão deste tribunal tem para os pais» e pediu coragem à magistrada para fazer justiça.

«Coragem, porque está aqui uma decisão profunda sobre liberdade. Coragem para defender a liberdade».

Pais e Warner Brothers ao lado da SIC

João Brito, representante legal da Warner Brothers, tal como os mandatários judiciais dos pais dos seis menores, subscreveram todos as palavras da SIC e salientaram que como foi provado em tribunal, através de relatórios e depoimentos de professores dos menores, as crianças estão bem e algumas até apresentam um melhor aproveitamento escolar, após terem participado no programa Supernanny.

Apenas um dos progenitores está em desacordo afirmando que não foi devidamente informado pela mãe da criança.

«Parte do trauma que se quis retratar é típico de uma sociedade que não está habituada a conviver com crianças. Peço a sua coragem para colocar as crianças no espaço público», disse dirigindo-se à juíza João Brito.

O programa Supernanny, entretanto suspenso provisoriamente, ficou envolto em polémica logo após a transmissão do primeiro episódio, emitido pela SIC no dia 14 de janeiro.

A estação de televisão SIC suspendeu o programa a 26 de janeiro, depois de uma decisão do tribunal desencadeada por «uma ação especial de tutela da personalidade» interposta pelo Ministério Público.

Nessa ação foi pedido ao Tribunal que fosse decretado, a título provisório e de imediato, que o programa a emitir não fosse exibido ou, «caso o tribunal julgue mais adequado, que essa exibição fique condicionada à utilização de filtros de imagem e voz que evite a identificação das crianças».

Face a esta decisão a SIC suspendeu o programa.

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