«Não há um deus castigador, nem que manda matar»

A afirmação de que «não há um deus que manda matar» é de Jaime Soares, da Comunidade Muçulmana do Porto, num debate que juntou representantes de várias religiões.

«Não há um deus castigador, nem que manda matar.» A afirmação foi proferida por Jaime Soares, membro da Comunidade Muçulmana do Porto, num debate que juntou representantes de várias religiões. Subordinada ao tema Encontro de Culturas, o debate, que decorreu no Colégio Júlio Dinis, no Porto, contou também com a presença de Ketan Thakrar (Comunidade Hindu do Porto) e do sacerdote jesuíta Luís Ferreira do Amaral.

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Moderado pelo apresentador do Porto Canal Pedro Carvalho da Silva, o encontro arrancou com um pedido. «Não posso contrariar a realidade que aconteceu. Peço que enviemos uma prece às vítimas do atentado de Estrasburgo e às suas famílias. Quero também deixar claro que, enquanto muçulmano, tenho muita dificuldade em entender que os autores de ataques terroristas se intitulem muçulmanos», afirmou Jaime Soares (Mahmoud). O representante da Comunidade Muçulmana no debate (português e filho de pais católicos) passou parte das suas intervenções a combater preconceitos fomentados pelos ataques terroristas. «Esse não é o Islão que nós professamos. Nenhum muçulmano advoga a guerra», sublinhou.

Comunidade muçulmana do Porto conta com 5 mil pessoas

Jaime Soares (Comunidade Muçulmana do Porto)

Portugal tem 50 mil muçulmanos. A grande maioria vive no sul do País. Na zona do Grande Porto residem cerca de cinco mil «completamente integrados». «Portugal é um país amigo dos muçulmanos e de todas as religiões. No Porto, a comunidade sempre nos acolheu de braços abertos», explicou ao Portal de Notícias o professor Jaime Soares. Segundo o docente, esta realidade não é comum a todos os países da Europa. «Em França, existem problemas gravíssimos de integração que estão na origem do terrorismo», explicou.

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Jaime Soares mostrou-se «grato» por poder «falar de um tema que vende tão pouco». «É raro ver pessoas que se juntam para falar de religião», disse. O membro da Comunidade Muçulmana do Porto quis passar uma mensagem clara. «Estamos aqui porque todos partilhamos algo em comum, o amor. O deus é o mesmo e é partilhado por toda a Humanidade. Acreditamos num único deus, que é Ala. Não é só muçulmano. É também cristão e de todas as religiões monoteístas.»

Hinduísmo é «um modo de vida» que ama «qualquer forma de vida»

Ketan Thakrar (Comunidade Hindu do Porto)

Esta mensagem foi também destacada por Ketan Thakrar. Residente em Portugal há 25 anos, falou do hinduísmo como sendo «um modo de vida», que tem como base o amor e a valorização de «qualquer forma de vida que está no Planeta». Ketan Thakrar, vice-presidente Comunidade Hindu do Porto, também se referiu a uma religião única onde é o amor que prevalece e é transversal a todos os cultos. «Somos cerca de 300 e estamos muito bem integrados», afirmou. O responsável confessou ter um especial apreço por Fátima. «Às vezes, vamos a Fátima todos de autocarro porque é um sítio que nos faz sentir bem. Pomos uma vela lá com o mesmo sentimento com que pomos uma lamparina no nosso templo», concluiu.

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Nas suas intervenções, o padre jesuíta Luís Ferreira do Amaral complementou a mesma premissa, a de que as religiões têm todas como base o amor pelo próximo. Crítico em relação à forma como a Europa lida com a questão dos refugiados sírios, o sacerdote condenou as pessoas «que fecham a porta a quem só quer fugir da guerra». Também no que se refere aos crimes cometidos por motivos religiosos, Luís Ferreira do Amaral relembrou que a igreja católica também «cometeu atrocidades».

«A história da igreja católica tem páginas negras como a da Inquisição», em nome de deus

Luís Ferreira do Amaral (sacerdote jesuíta)

Atrocidades «não são algo exclusivo do islamismo». «A história da igreja católica tem páginas negras como a da Inquisição e a evangelização à força», recordou. À margem do evento, o clérigo louvou a iniciativa que lhe proporcionou um momento de «aprendizagem». «É sempre enriquecedor e uma foram de aprender e de contribuir para construirmos pontes para a paz no Mundo, que bem precisa dela», concluiu.

Texto: Cynthia Valente; Fotos: João Ribeiro | WIN Porto

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