Sessão dupla com dramaturgias de Bernardo Santareno estreia-se no São João no Porto

Os espetáculos “A Promessa” e “O Pecado de João Agonia”, do dramaturgo português Bernardo Santareno, estreiam-se na quinta-feira, no Teatro Nacional São João, no Porto, numa sessão dupla, em que o mesmo elenco interpreta as duas dramaturgias.

Sessão dupla com dramaturgias de Bernardo Santareno estreia-se no São João no Porto

“Decidimos fazer um desafio a nós próprios, colocando estes dois textos no mesmo mundo, na mesma cenografia, no mesmo espaço, que é a casa onde se desenvolve o drama, e um desafio aos atores. É o mesmo elenco que faz os dois espetáculos”, pois o mesmo ator na mesma sessão vai fazer “duas personagens”, conta o encenador João Cardoso.

Em entrevista à agência Lusa, à margem do ensaio de imprensa, João Cardoso destacou o desafio para os atores fazerem esta “dose dupla de Bernardo Santareno”, pois os atores vão estar em palco mais de três horas — com um intervalo de 45 minutos – a interpretar duas personagens diferentes, uma em “A Promessa” e outra em “O Pecado de João Agonia”.

“Foi desafiante, porque nós vamos vê-los no espaço de três horas e meia a fazer duas coisas que a gente quer que sejam distantes uma da outra, para abrir a análise do espectadores”.

No diálogo entre os dois espetáculos vão ser contados dois dramas escritos por Bernardo Santareno (1920-1980), que decorrem em duas regiões diferentes de Portugal — na zona costeira e na zona serrana -, e onde vão ser abordados temas como a homossexualidade, a xenofobia e a religião acoplada à culpa e ao sacrifício.

“A Promessa” (1957) passa-se numa região costeira com uma família que vive da pesca. Mediante o naufrágio do pai, os filhos fazem a promessa de se manterem castos durante o casamento. Mas entretanto dá à costa um contrabandista ferido que vai parar à casa da família de pescadores. Esse homem, um cigano, e a mulher que vive na casa apaixonam-se e desenvolve-se ali um drama à volta deste tipo de relações.

“A gente nunca chega a saber se a promessa foi feita unicamente por causa do naufrágio do pai, ou se há mais qualquer coisa escondida”, observa João Cardoso.

Na dramaturgia de “O Pecado de João Agonia” (1961), a ação acontece num “lugarejo serrano”, onde um filho regressa do serviço militar. Essa chegada vai ser um problema, porque se descobre que ele é homossexual e que foi preso na tropa.

“O problema é também denunciado na aldeia. Os homens mais velhos da família decidem matá-lo pela pressão social […]. É, digamos, uma espécie de manter a família sã”, explica o encenador.

A sessão dupla de Bernardo Santareno apresenta “duas histórias com uma carga dramática muito grande: uma por causa da homossexualidade do João perante a sociedade; em ‘A Promessa’ é o problema da Maria do Mar e o ostracismo pelo marido”, descreve.

Neste espetáculo “Bernardo Santareno x 2”, o cenário representa a casa, que é uma “espécie de esqueleto”.

Na peça “A Promessa” há imagens do mar, das tempestades, do mar calmo, como se flutuasse, tal como os humores da casa. Na peça “O Pecado de João Agonia”, o cenário é feito por lutas de paus, porque antigamente nas feiras havia essas lutas, “até para libertar tensões que existiam entre vizinhos, entre conhecidos”, e essa tensão acompanha o decorrer da história.

A estreia acontece na quinta-feira, dia 19, no Teatro São João, às 19:00. Depois segue, no dia 18 de novembro, para Santarém para assinalar o aniversário de Bernardo Santareno, natural dessa cidade, para Ponte de Lima, nos dias 8 e 9 de dezembro, e para Bragança, no dia 20 de janeiro de 2024.

Os espetáculos, uma coprodução da Assédio e São João, contam com Regina Guimarães na dramaturgia.

O elenco é composto por Ângela Marques, Benedita Pereira, Daniel Silva, Inês Afonso Cardoso, João Cardoso, João Castro, Maria Inês Peixoto, Pedro Galiza, Pedro Quiroga Cardoso, Rúben Pérola e Susana Madeira.

A sonoplastia está a cargo de Francisco Leal, a cenografia e figurinos é da responsabilidade de Sissa Afonso, o desenho de luz é de Filipe Pinheiro e Nuno Meira e a captação de imagem e vídeo é de Jorge Murteira.

“A Promessa”, escrita em 1957, foi estreada em 23 de novembro do no ano seguinte, pelo Teatro Experimental do Porto, numa encenação de António Pedro, com os atores Ruy Furtado, Dalila Rocha e João Guedes, nos principais papéis.

Estreada durante a ditadura, a peça foi retirada de cena poucos dias após a estreia por ter sido proibida pela censura, segundo os elementos disponíveis na base de dados do Centro de Estudos de Teatro, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

“A Promessa” foi adaptada ao cinema por António de Macedo, em 1972, num filme selecionado para o Festival de Cannes e premiado em Cartagena, que teve em Guida Maria, João Mota e Sinde Filipe os principais atores.

A peça “O Pecado de João Agonia”, de 1961, foi estreada pela Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro, em 12 de novembro de 1969, numa encenação de Rogério Paulo, num elenço encabeçado por João Perry, Mariana Rey Monteiro, Glicínia Quartin e o próprio Rogério Paulo.

*** Serviço áudio disponível em www.lusa.pt ***

CCM // MAG

By Impala News / Lusa

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