O nosso fado

É um enigma que Fado, depois de conquistar vários prémios por onde passou, fique pelo circuito dos festivais e não esteja prevista a estreia nas salas de cinema portuguesas. Falta de interesse dos programadores nacionais? Desconhecimento do que se anda a produzir? É o nosso fado cultural.

O nosso fado

Dois anos depois de ter sido rodado em Lisboa, no sábado passado estreou o filme FADO, do realizador alemão Jonas Rothlaender, no âmbito do festival KINO – Mostra de Cinema de Expressão Alemã. Uma co-produção luso-alemã que conta com os actores portugueses Albano Jerónimo, Isabel Abreu, Susana Borges e Rui Morrison no elenco.

A primeira longa-metragem de Rothlaender conta-nos uma história de obsessão. Fabian (Golo Euler), médico alemão, decide viajar para Lisboa para reconquistar a ex-namorada Doro (Luise Heyer), arquitecta que se estabeleceu recentemente na cidade. Entre surfadas, aulas de Português e viagens nocturnas numa carrinha de apoio aos sem-abrigo, acaba submerso por fantasmas do passado.

Ofereço um aviso aos alfacinhas com a síndrome de terramoto de 1755 – algumas cenas são susceptíveis de provocar taquicardia. Eu sofri uma síncope

Para além de recomendar as belas imagens de Lisboa por um olhar estrangeiro, ofereço um aviso aos alfacinhas com a síndrome de terramoto de 1755 – algumas cenas são susceptíveis de provocar taquicardia. Eu sofri uma síncope com uma delas, mas relatar a história de um filme é semelhante a contar uma piada começando pelo fim, e eu, que sou vossa amiga, não o farei.

É um enigma que Fado, depois de conquistar vários prémios por onde passou, fique pelo circuito dos festivais e não esteja prevista a estreia nas salas de cinema portuguesas. Falta de interesse dos programadores nacionais? Desconhecimento do que se anda a produzir? É o nosso fado cultural. Não sejam palermas e ponham esta maravilha a rodar nas salas.

Depois de Lisboa, o festival Kino segue para o Porto (26 a 29 de janeiro) e para Coimbra (1 a 3 de fevereiro). Aproveitem para ver o filme

E por falar em cinema alemão, na semana passada chegou também às salas de cinema o documentário Vita Activa: The Spirit of Hannah Arendt, realizado por Ada Ushpiz. A obra aborda a vida profissional e privada da filosofa e teórica política alemã que causou controvérsia nos anos 60 ao desenvolver a teoria de “banalidade do mal” na cobertura do julgamento de Adolph Eichmann para a revista The New Yorker

Hannah_Arendt

Olhar para o passado para compreender melhor o presente – documentário imprescindível para quem anda atarantado a tentar perceber como é que a administração Obama degenerou na subida de Trump ao Poder; os abalos políticos e económicos recentes na Europa que culminaram no Brexit, a saída da Grã-Bretanha, quinta maior economia no mundo, e a permanência de países economicamente mais fracos na UE, como a Grécia, apesar de todas as ‘ameaças’ de abandonarem o barco; e, por último mas não menos importante, a entrada maciça de refugiados no território europeu e os atentados cada vez mais frequentes que têm contribuído para um apoio crescente aos partidos e movimentos de extrema-direita europeus. Pensem nisso e vão ao cinema. Ou ao contrário.

SofiaAfonsoFerreira

Sofia Afonso Ferreira, escritora ([email protected]) | Foto Carlos Ramos

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